CORPO
Este
desconsolo de ficar
Numa
hora insuspeita da noiteDiluído numa sinfonia abstrata
E perante a transitoriedade do amor
Ir buscar no sono distante
A fuga da fuga!
Meu
coração se incorpora
À
terceira galáxiaE se recusa – violento –
Desprender-se do eterno.
Talvez se memória ajudasse.
Se um corpo de mulher
- um corpo etéreo de mulher –
Surgisse sobre o ombro
Para colher este poema
- uma flor de bronze –
E
depois submergisse
Ao
contato de outro corpo- meu corpo perplexo e confuso –
O
dia seria uma conjugação possível.
Mas
o tempo avança,
Se
enrosca aqui e acolá,Anuncia tornados, isola os amantes,
Sufragando uma noite peremptória
na alma de descuidado vivente.
Na
infância aprendi lições de romantismo.
Na
idade adultaEstas lições agora emolduradas
Em velhos casarões
Reúnem-se
a incríveis paisagens
Para
zombar dos descuidos sentimentaisQue a cada espaço de vida
Desfalecemos
- a vida vira coisa incerta -.
Mas
se a memória ajudasse!
Porém
o ar retém uma imagemQue obscura o cérebro,
Conduz a insônias terríveis
E – de surpresa – repousa no travesseiro
Para ternamente dizer de um tempo pretérito
Onde
certa vez o amor aconteceu de súbito.
Não.Não há consolo quando o coração
Pretende fugas ao eterno.
Madrugada
começa a busca
de
um sucedâneo para a solidão.
Será
vão – mas percorremos o quarto vazio:
- Lençóis rebuscados restam
Como testemunho da febre
Que antecede a diluição da entrega –
Só
mais tarde,
Muitíssimo
mais tarde,
Ocorre
de improviso
Ao
artista que em pleno palcoPerdeu sua máscara:
O corpo é a um só tempo:
- fogo, miragem, espera.
(Observação:
se não me engano este poema foi escrito em 1974. Ele tem algo de “precognição” pela
experiência que vivenciei após o falecimento da Lenir. Na data de ontem eu creio ter deixado a Lenir - e a mim mesmo - realizarmos nossas libertações.)